A Polícia Civil prendeu na manhã desta segunda-feira uma mulher identificada como Thuane Pimenta dos Santos, de 23 anos. Ela teria entregue a menina de 2 anos para o coronel reformado Pedro Chavarry Duarte, de 62 anos, que foi preso acusado de estupro de vulnerável e corrupção ativa. A criança foi encontrada nua no carro do oficial na noite de sábado.
De acordo com a delegada Cristiana Bento, titular da Delegacia da Criança e do Adolescente Vítima (Dcav), ela foi encontrada em casa, na comunidade Uga-Uga, em Ramos.
— Vamos colher depoimentos, fazer diligências e avaliar a possibilidade de haver um esquema de tráfico de crianças — disse a delegada, acrescentando que a hipótese de estupro já está confirmada.
Thune já tinha proximidade com a família da criança. Ela fazia serviços de faxina na Caixa Beneficente da Polícia Militar, onde o acusado é presidente, e também fez serviços de panfletagem quando Chavarry se candidatou a deputado federal em 2014. Os pais da menina prestaram depoimento neste domingo na Central de Garantias, na Cidade da Polícia.
De acordo com a delegada o pai da criança teria dito que Thuane levou a garota com o pretexto de fazer um cadastro para ganhar presentes de Natal e fazer fotos com Papai Noel. Segundo a delegada, eles serão ouvidos mais uma vez para prestar novos esclarecimentos.

CORONEL TENTOU EXTORQUIR POLICIAIS

Policiais militares disseram que o oficial ainda tentou suborná-los para escapar. Chavarry, que foi autuado por estupro de vulnerável e corrupção ativa, possui um histórico de crimes contra crianças: em 1993, ele chegou a ser preso sob suspeita de tráfico de bebês, mas não foi condenado.
Na noite de sábado, algumas pessoas que passavam pelo estacionamento de uma lanchonete, que fica num posto de gasolina, em Ramos, notaram que havia uma criança sem roupa em um Jetta branco, junto com um homem, e ligaram para a polícia. Quando os PMs chegaram, Chavarry se assustou e tentou fugir com o veículo, mas foi obrigado pelos policiais a parar na Rua Barreiros.

Segundo o relato dos PMs que realizaram a prisão, ao ser flagrado com a menina, o coronel se identificou como um oficial superior, disse aos policiais para não darem prosseguimento à ocorrência e sugeriu que “resolvessem” a situação ali mesmo. Percebendo que o coronel tentava escapar do flagrante, um dos policiais passou a filmar discretamente o acusado:

— Segunda-feira, eu resolvo tudo. Vamos acabar com essa ocorrência, entendeu? Eu resolvo tudo. Segunda-feira vai fazer sol. Está ventando hoje — diz Chavarry a um dos policiais, que se faz de desentendido, enquanto o coronel explica melhor suas intenções. — Segunda-feira, eu resolvo tudo. Quero saber sua escala. Você vai me procurar e eu vou te procurar. Você e o seu parceiro. Tá certo? Fica atento para acabar com essa ocorrência, tá? Dentro das normas — diz o coronel.

No momento da abordagem, de acordo com os policiais, chegou ao local uma mulher e disse que o coronel reformado cuidava da criança e de uma outra menina de 12 anos. Passados alguns minutos, ainda de acordo com os PMs, outra mulher chegou e informou que o acusado pagava para sair com as meninas.

Os policiais não aceitaram a proposta e levaram o coronel para a Cidade da Polícia, no Jacaré. Em seguida, ele foi encaminhado ao Batalhão Especial Prisional (BEP) da PM, em Niterói, onde permanece preso.

Neste domingo, uma testemunha que trabalha próximo à lanchonete informou que esta não foi a primeira vez que o militar foi visto ali, acompanhado por crianças.

O coronel foi autuado em flagrante pela delegada Carolina Marins, da Central de Garantias. O militar entrou para a Academia da PM aos 19 anos. Passou por diversos batalhões, como os de São Cristóvão, Campos, Bangu e Olaria, e pelo gabinete de quatro comandantes-gerais, além de ter sido relações-públicas da PM e membro da mesa diretora da Irmandade de Nossa Senhora das Dores da Polícia Militar, que tinha até 2009 um abrigo para meninas. Em 2014, o coronel foi candidato a deputado federal pelo Partido Social Liberal, mas não conseguiu se eleger.

A PM informou que o coronel será submetido a um processo administrativo disciplinar, que julgará seu destino na corporação.
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ENVOLVIDO NO TRÁFICO DE BEBÊS

O secretário estadual de Assistência Social e Direitos Humanos, Paulo Melo, lembra que, na década de 90, quando presidiu uma Comissão Parlamentar de Inquérito na Assembleia, participou da prisão de Pedro Chavarry Duarte, acusado de tráfico de bebês:

— Fui procurado por uma associação de moradores de Bangu, que relatou o envolvimento de um PM na venda de crianças. Montamos uma operação com a ajuda do 14º BPM (Bangu) e ficamos esperando no local onde os bebês eram deixados de manhã, sob o efeito de tranquilizantes, e, à noite, levados pelo bando. Quem da quadrilha chegou para pegar o bebê, de apenas quatro meses, foi o então capitão Chavarry, preso em flagrante.

Para Melo, pode haver um envolvimento sistemático do PM em situações de abuso e tráfico de menores desde a década de 90:

— Ele se aproximava das mães, geralmente de comunidades muito carentes, e dizia que trabalhava para a Igreja e iria arrumar uma creche. Até colocava os bebês em creches, mas, em seguida, convencia as mães de que elas não tinham condições de criá-las , e que o melhor seria doá-las. Depois, essas crianças eram vendidas pelo oficial.

Melo determinou que a secretaria acompanhe o caso. Quer saber se Chavarry continuava a atuar no rapto de menores. E ainda como ocorreram as promoções do oficial, sem levar em consideração o seu histórico criminal.

Em nota, a Caixa Beneficente da PM lamentou o ocorrido com o presidente licenciado Pedro Chavarry Duarte. A CBPMERJ informa que se mantém em pleno funcionamento, cumprindo com todas as obrigações legais com seus associados, beneficiários, colaboradores e fornecedores e que os fatos noticiados serão apurados na instrução criminal, respeitados os princípios constitucionais da presunção da inocência, do devido processo legal e o contraditório.